Lembro daquelas tardes de verao com tanta saudade. Minha avo segurava o queixo com as maos e se apoiava na varanda enquanto se distraia com o canto do bem-te-vi e me olhava serelepe repetindo o canto do passarinho. Eu olhava e ria. Depois corria para cheirar as orquideas e vez que outra via uma borboleta colorida voar entre as pedras.
Foi ela quem me fez acreditar nas asas.
Na semana santa me vestia de anja, me atava penas brancas nas costas e me dava uma cesta cheia de petalas de rosas. Juntas desfilavamos assim pelas ruas do centro. Espalhando as petalas pelos caminhos. Depois me esnsinava a entender as figuras nos vitros das Catedrais e me levava para comer doce na confeitaria da esquina.
Foi ela quem me ensinou a ser assim.
Quando dezembro chegava ia correndo para sua casa para ajudar a montar o pinheirinho de Natal. As luzinhas sempre emaranhadas entre si e o presepio enrolado em folhas de jornal. Depois ela sentava em sua maquina de costura e com toda a paciencia do mundo me ensinava a tecer pequenas costurinhas em paninhos velhos. E eu com os olinhos estalados da crianca que quer aprender tudo, metia meus dedinhos pequenos entre a agulha da maquina que ia bordando feito magica, linhas vermelhas no pano branco.
E assim aprendi a remendar cada pano velho e com todo trapo esfarrapado fiz brinquedo. Hoje vou remendando a alma com essa linha fina da fe. Escondendo cada desamor com fiapos coloridos e cada tristeza com pedacos de tecidos.
Quando ao fim da vida sentada em sua cadeira de balanco ela me contava de suas aventuras, perdas e fardos, eu assustada lhe perguntava como ela conseguiu superar tudo aquilo. Acho que o que me espantava era o fato de que nenhuma perda, por maior que tenha sido, conseguiu tirar o sorriso do olhar de minha avo. Acho que era a magia dela que me metia medo, porque eu tambem queria um dia ser assim e sabia que a estrada que ela havia seguido so e descoberta por quem nunca perde o encanto da vida, porque a percebe como um longo e demorado poema.
Ela me ollhou rente a alma e com os olhos azuis que sempre brilharam demais me respondeu que tinha apenas um jeito; seguir sempre em frente confiando na maezinha do ceu sem jamais olhar pra tras. E ela me repetiu: e seguir sempre em frente sem olhar pra tras.
Hoje em dia vez que outra espio o passado, recolho as memorias como pequenos pedacinhos de tecido que vao montando esta colcha velha, a saudade me ajuda a lembrar de quem eu fui um dia, cada vez que esse corpo cansado pensa em desistir em continuar acreditando nesse longo poema que pintamos com lagrimas e sorrisos. Mas e assim a vida e somente atravez do que amamos e perdemos que descobrimos a verdadeira essencia de que somos feitos. Ou ganhamos asas ou rastejamos para sempre pelo solo das amarguras.
Ela sempre optou pelas asas e em seus voos me ensinou que as coisas mais simples da vida, sao realmente as mais importantes. Hoje la de cima, ela me olha e sorri, sei que ela sabe que ainda estou tentando entender esse longo poema e como minha anja da linhagem de sangue, ela assopra sinais de esperanca sempre em meu ouvido. Obrigada Irma Frantz.
Ana Frantz
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